Frustração e indignação: como a NBA chegou ao ponto de um boicote histórico
Presidente da associação de jogadores da NBA, Chris Paul já demonstrava que o clima na bolha da NBA em Orlando não estava bom na segunda-feira. Menos de 24h antes um novo caso de violência tomou conta dos Estados Unidos. Jacob Blake, um homem negro de 29 anos, foi alvejado com sete tiros pelas costas por policiais brancos após tentar separar uma briga entre duas mulheres. Ele estava desarmado e com os filhos. Internado em estado grave, Blake perdeu o movimento da pernas e luta pela vida. Os policiais seguem em liberdade. Após a vitória de Oklahoma sobre o Houston, na prorrogação, por 117 a 114, Chris Paul ignorou a pergunta sobre o jogo e usou a entrevista na quadra para mandar uma mensagem.
– Eu só quero enviar minhas orações para Jacob Blake e sua família. Nós decidimos vir aqui para jogar, e dissemos que vamos falar sobre a injustiça social. E as coisas que continuam a acontecer ao nosso povo. Não está certo. Não está certo. Há muita coisa acontecendo no país. Você sabe, esportes – é legal, é bom e, bem, é assim que cuidamos de nossas famílias. Mas esses são os verdadeiros problemas que temos que começar a abordar – disse.
Lebron James, que também jogou na segunda-feira, fez o mesmo horas depois após a vitória dos Lakers sobre o Portland Trail Blazers.
– Por que sempre tem que chegar ao ponto em que vemos as armas disparando? – questionou.
O caso de Jacob Brake começou a gerar um sentimento geral de frustração e indignação nos jogadores. Em uma negociação com a NBA, eles só aceitaram retornar com a temporada quando a liga entrou em acordo para transformar a volta em uma plataforma na luta contra as injustiças sociais. Eles teriam voz para se manifestar. A quadra, então, ganhou a enorme mensagem “Black Lives Matter” (Vidas Negras Importam), uma campanha que ganhou força em maio com a morte de George Floyd, um negro que morreu asfixiado por um policial branco durante uma abordagem. Durante a execução do hino americano, todos se ajoelhavam em protesto. E os uniformes trazem mensagens com protestos sociais escolhidas pelos jogadores. Mas diante do novo caso todos começaram a se perguntar. Isso está dando certo? Veio a reflexão se a mensagem realmente estava dando resultado ou se era preciso atitudes mais radicais.
No dia seguinte, o técnico do LA Clippers, Doc Rivers, um dos mais respeitados na Liga, também se pronunciou durante o jogo do time contra o Dallas Mavericks: “Continuamos amando este país, e este país não nos ama de volta”.
O assunto ganhava cada vez mais força. Jogadores de Toronto Raptors e Boston Celtics começaram, então, a conversar sobre a ideia de não entrar em quadra na quinta-feira para o jogo 1 da semifinal da Conferência Leste.
– Sabíamos que vir ou não aqui, não iria impedir nada, mas acho que jogar ou não jogar pressiona alguém – disse Fred VanVleet , o armador do Raptors, após o treino de terça-feira.
Pouco depois, Jaylen Brown, jogador dos Celtics, postou no twitter na terça-feira à noite a intensão de abandonar a bolha em Orlando para ir protestar nas ruas: “Eu quero ir protestar”, escreveu.
Pascal Siakam, uma das estrelas do Toronto Raptors, atual campeão a NBA, resumiu o sentimento dos jogadores com o que estava acontecendo.
– Nós só queríamos fazer a diferença, queríamos fazer uma mudança. E ver isso (Jacob Blake ser baleado por policiais de Wisconsin com sete tiros nas costas) mostra que as coisas estão iguais. Isso nos faz questionar: ‘Você tomou a decisão certa ou não?’. E para mim, dói. Dói ver isso – disse Pascal.
Kenosha, cidade onde Jacob Blake foi alvejado pelas costas por um policial branco, fica no estado de Winsconsin, onde também está Milwaukee. Os jogadores dos Bucks, então, resolveram tomar uma atitude histórica, que surpreendeu os dirigentes da NBA. O time abriria a rodada de quarta-feira da NBA contra o Orlando Magic. Seria o 5º jogo do duelo nos playoffs. Enquanto os rivais se aqueciam, os Bucks não apareceram na quadra. Um comissário da NBA foi até o vestiário para entender o atraso e encontrou a porta trancada. Veio então a notícia de que os jogadores tinham decidido pelo boicote. A decisão acabou gerando um efeito cascata. E os jogadores de Rockets, Thunder, Lakers e Blazers seguiram o exemplo e anunciaram que também não entrariam em quadra nas horas seguintes forçando a NBA anunciar que todos os jogos de quarta-feira estavam adiados. Ou melhor, boicotados, como reforçou Lebron James.
Globo Esporte